sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

A Morada de Dioniso

Caros ATMeenses,

Encontrei o paraíso... É verdade!! En
quanto não nos mudamos para lá, convido-vos a viajar na vossa imaginação...


«[...] Ainda não tínhamos andado muito, quando deparámos com um rio em cujo leito corria um vinho extremamente parecido com o de Quios. A corrente era caudalosa e profunda, de tal modo que, em certos lugares, poderia mesmo ser navegável. [...]
Ora, tendo resolvido descobrir onde nascia o rio, fui subindo ao longo da
margem, não encontrando qualquer nascente, mas sim muitas e enormes videiras, carregadas de cachos; junto à raiz de cada uma, escorria um fio de vinho transparente - fios esses donde se formava o rio. Também podíamos ver nele muitos peixes, de cor e gosto muito semelhantes a vinho. Então pescámos alguns e comemo-los, com o que ficámos embriagados. É certo que, tendo-os aberto, os achámos cheios de mosto. Mais tarde, tivemos a ideia de os misturar com outros peixes, os de água, a fim de destemperarmos a comida avinhada em excesso.
Foi então
que, tendo passado o rio onde havia vau, descobrimos algo de muito espantoso que se passava com as videiras: da parte que saía da terra, o tronco propriamente era vigoroso e grosso, enquanto na parte de cima eram mulheres, com todas as partes completas das ancas para cima. [...] Da ponta dos dedos nasciam-lhes ramos, que estavam carregados de cachos. Além disso possuíam uma farta cabeleira de gavinhas, parras e cachos. Quando nos aproximámos, não paravam de nos cumprimentar e saudar [...] e beijavam-nos na boca. Aquele que era beijado ficava imediatamente embriagado e cambaleante. Contudo, não nos deixavam colher qualquer fruto, mas antes gemiam de dor e gritavam, se lhes arrancavam algum. Outras manifestavam mesmo desejos de se unir a nós, e aconteceu que dois dos nossos companheiros, tendo-se chegado a elas, já não eram capazes de se libertar, pois ficaram presos pelas partes viris. E de facto, cresciam juntos e criavam raízes em comum, e já mesmo lhes nasciam ramos nas pontas dos dedos; ficavam entrelaçados nas gavinhas e, em pouco tempo, estavam eles próprios aptos a dar fruto. [...]»
Luciano (125-190 d.C.), Uma História Verídica.


Bebam como se não houvesse amanhã...

Saudações Dionisíacas e ATMeenses*

5 comentários:

Mohammed Saeed Al Sahaf disse...

Quero-me me afogar nesse rio e quero constituir família com essas videiras para assim purificar toda a minha alma.
Adorei o texto, adorei as metáforas e começo a tornar-me religioso, pelo menos aos fins de semana vou sempre à missa...
Que Dioniso nos abençoe para que possamos beber como se não houvesse amanhã.

Saudações ATMeenses

Carla disse...

Gostei do texto.
Beijos e bom fim de semana

Hugo disse...

Eu gostei muito do texto, mas como não conheço esse tal de Luciano saúdo quem o encontrou...
Se o paraíso é assim quero ir já para lá!!!!

Davidoff disse...

"...ficaram presos pelas partes viris" lol, a julgar pela 1ª foto eram mais partes viriszinhas!!
Tb adorei o texto, e seguramente não me importaria nada de ficar embriagado, através de longos beijos de ninfas do vinho!

Ariadne disse...

Fico contente por ver que ainda há alguns ATMeenses que gostam de se enriquecer culturalmente... E que têm sensibilidade literária...

Já agora, esclarecendo o Camarada, que diz que não conhece "esse tal de Luciano", o autor nasceu em Samósata, capital do antigo reino de Comagena, situado a norte da Síria, na margem direita do Eufrates, portanto actual Turquia. Os primeiros imperadores romanos conservaram-lhe certo grau de independência, mas acabou por ser incluído entre as províncias do Império. Como já está expresso no artigo, aceita-se como datas de nascimento e morte 125-190 d.C. Importa referir que Luciano escrevia em grego clássico, a sua vida literária desenvolveu-se na segunda metae do séc. II d.C., por um período de quarenta anos, durante o qual escreveu cerca de oitenta obras.

Em Uma História Verídica, Luciano «faz-nos embarcar numa aventura louca, num longo cruzeiro destinado a ser estudo, mas que se transforma, logo de início e numa sequência diabólica, em peregrinação aventurosa...» Luciano «no século II, escreve um dos mais espantosos espécimes de fantasia à solta, que nada fica a dever às obras dos mais célebres autores de ficção dos séculos seguintes, incluindo a banda desenhada e o cinema fantástico».
É com a Odisseia que nasce a literatura fantástica e de viagens, mas esta obra é sem dúvida uma grande percursora. Para quem gosta de Tolkien, este veio "beber" aqui muita da sua inspiração...

Saudações Dionisíacas e ATMeenses*